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sexta-feira, 6 de março de 2009

A Realidade Nordestina



Durante o carnaval aproveitei para reler a monumental obra de José Lins do Rego relativa ao Ciclo da Cana do Açúcar no Nordeste. Mais do que romances relatam o patrimonialismo então, ali existente. São livros preciosos para se entender a formação do patriarcado nordestino criado pela industria da cana. Com efeito, Menino de Engenho, Doidinho,Bangüê, Usina, Fogo Morto retratam com precisão a história do coronelismo no Nordeste e seus desdobramentos até os dias de hoje.Mostram a dureza da vida dos pioneiros daquela industria.Mas também mostram que a escravidão,à época, no Nordeste, não terminou com a Lei Áurea, com o sofrimento e injustiças sofridas por quem não era dono de terras. Vitor Nunes Leal em seu “Coronelismo, Enxada e Voto” e o recente “Família e Coronelismo no Brasil” de André Heráclio do Rego, esgotaram o assunto, razão porque me escuso comentá-lo com mais detalhes.O que me interessa são os reflexos que até hoje, o “ciclo da cana de açúcar” tem sobre a realidade atual nordestina, principalmente no estamento político e na governança pública, em geral.
Não sou nordestino, mas visito o nordeste, anualmente, por razões afetivas -tenho ascendentes pernambucanos- não só suas capitais como o interior. Bons amigos me põem a par do que ali vem acontecendo.Com eles, quando vejo refluxos de patriarcalismo, costumo brincar : vocês ainda estão no ciclo da cana de açúcar...
Mas, vamos à realidade atual. Continua a mesma e violenta desigualdade na distribuição de renda. Ausência de planejamento familiar, agravada pela posição retrógrada da igreja católica, no particular.Alto índice de mortalidade infantil Escasso e baixo nível educacional. Carência alimentar para maioria dos menos aquinhoados.
Complementando tudo isto, ainda remanescem na política alguns “coronéis” do ciclo da cana de açúcar.O currais eleitorais proliferam trazendo ao governo típicos representantes desse passado.Não é de espantar que vários governadores do Nordeste estejam na mira do Tribunal Superior Eleitoral, para possíveis cassações de seus mandatos e, o da Paraíba, acabou de ser cassado.
Mas, há também grandes melhorias. Ceará e Bahia têm conseguido grandes progressos na eliminação da mortalidade infantil.Centros industriais e agrícolas tem sido criados a exemplo dos portos de Pecem, no Ceará e, Suape em Pernambuco. Barreiras, no interior da Bahia, mostra quanto a agricultura moderna pode trazer ao desenvolvimento. Cidades litorâneas, aproveitando a beleza das praias, tem conseguido atrair investimentos estrangeiros na construção de hotéis de primeira linha, aumentando o turismo, esta grande industria. O barroco das igrejas extasia o visitante Isto gera empregos, o que é vital para a região.Acresce a tudo isto a grande contribuição nordestina ao artesanato popular e à musica popular brasileira, com suas casas de cultura e seus grandes interpretes musicais. Que o digam os baianos. Quem visita o Alto do Moura em Caruaru (PE), esbanja-se com a criatividade e beleza da obra do artesão.Mas, acima de tudo, o que mais aprecio em minhas visitas ao Nordeste é a cordialidade , a simpatia da gente nordestina, do mais pobre ao mais rico.
O Nordeste foi a região que mais sofreu com a retrograda colonização portuguesa. O açúcar trouxe a escravidão em grande escala com conseqüências até hoje sentidas.Muito ainda tem que ser feito em benefício da região, principalmente em obras de infra estrutura. Avulta ai a necessidade de levar água as regiões do semiárido e outras. O solo do Nordeste, quando devidamente irrigado, mostra sua produtividade. Exemplo: Petrolina e Juazeiro com suas magníficas plantações de uvas e até produzindo vinhos de qualidade. Por isto não entendo a oposição de , espantem-se, alguns nordestinos, ao projeto de transposição de águas do Rio São Francisco, projeto que venho defendendo há vários anos, e que retira do Rio no máximo 10% da água doce que joga no oceano. A estes lembro a região do sul da Califórnia (USA), onde chove menos que no Nordeste.Pois bem. Com a transposição das águas do Rio Colorado, que corre ao sul da região, e conseqüente irrigação da área, a Califórnia é hoje o pomar da América. Já imaginaram a multiplicação de “Juazeiros” e “Petrolinas” por todo o Nordeste?
Muito se poderá falar da realidade nordestina. Mas, para que o Nordeste atinja o sucesso que merece, quatro pontos básicos hão de ser satisfeitos: Máximo investimento em educação, boa infraestrutura, bom planejamento dos recursos disponíveis e, principalmente, gente competente para executar os projetos. O progresso virá em conseqüência.
---X---
Almirante, empresário, escritor.
Membro do Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio
jcmacedosoares@attglobal.net>

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